Uma foto me
mordeu hoje. Havia nela um rosto familiar escondido. Olhos doces me espiavam
através da tela, mas estavam bravos comigo. Como
você está? - eu me indago. Sei que essa pergunta também seria feita para
mim, em tom sincero, de alguém cujo coração emanava bondade. Parece um retrato
pouco realista da vida ou de uma pessoa, mas eu via assim. Eu via o melhor. Acho
que ainda vejo. Mas eu magoei e aos poucos tomei essa mágoa pra mim, como se
toma um delicioso copo de chocolate quente.
Voltei no
tempo. O que me fascinava tanto, afinal? A franqueza inata. Só pode ser. Estava
lá pintada sorrindo, gritando e, talvez, esperando. Eu me convenci de que as
coisas podiam ser e esperei. A vida me mostrou que estava certa, mas não podia
ter feito tudo de maneira mais errada. Nunca gostei disso de “certo” ou “errado”.
Viver é mais do que adjetificar os nossos feitos. Contudo, pelo menos agora, eu
tenho que admiti que errei.
Errei por não
me deixar ser conhecida. Errei por não consegui perdoar. Errei por não
entender. Errei por não ter forças para voltar atrás. Errei por deixar olhos
tão bons zangarem-se comigo. Errei. E meu maior engano, foi não ter tirado
lições de todos esses erros. Foi ter feito apenas um texto. Com palavras que
nunca disse. Que nunca criei. Que apenas vomitei, junto com uma ausência que
sempre me perseguiu.
Eu disse “não”,
porque queria um “sim” maior. Um sim
eterno, sob meu controle. Esqueci que há vontades além das minhas. E que tanto
palavras como atos podem levar a amplas interpretações. Interlocutores doentios
quando acham-se donos do destino do outro ou do seu próprio. Não há script aqui.
Só escolhas que não se cruzam. Futuros obscuros. Poderemos ser donos do nosso amanhã? Espero que sim e tenho cada
vez uma convicção maior que não. Sem certeza de quem somos hoje, como saberemos
da pessoa que se esconde no futuro? E as escolhas do amanhã são feitas por ela,
não por nós.
Todavia, isso
era sobre olhos doces, zangados e tristes. Olhos de quem compartilhava o passado
e as lágrimas sem medo. Há alguém aqui que também fazia o mesmo. Essa
melancolia era um elo forte demais para ser quebrado. Pelo menos até o dia em
que ela resolveu descansar e dar espaço à felicidade verdadeira, escondida na
forma de paz. Aí já não havia nada a conectar. Tudo deixou de ser si mesmo. E o
futuro converteu-se em presente, implacável. Deixando olhos sorrindo a me
espiar.